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Brucella nosferati: Uma Nova descoberta patogênica em morcegos-vampiros



Brucella é um gênero de bactérias gram-negativas, em forma de  cocobacilos. São  formadoras de pequenas colônias e responsáveis por causar a doença chamada Brucelose. Esta doença é uma enfermidade zoonótica de distribuição mundial e de grande importância sanitária e econômica (Moreno et al. 2006). Essa doença está relacionada primariamente à sintomatologia reprodutiva e já foi relatada em diversas espécies de animais selvagens, incluindo aquáticos. Outrossim, Desmodus rotundus, chamado popularmente de morcego-vampiro, possui grande importância sanitária devido ao seu papel na transmissão de doenças (Greenhall et al. 1983). Devido ao fato de se alimentar diretamente do sangue de mamíferos, seu repasto sanguíneo representa um risco significativo para animais domésticos, silvestres e humanos, uma vez que essa espécie pode atuar como vetor de patógenos graves, como o vírus da raiva (Alves et al. 2022). Deste modo, esses fatores relatados coexistem em grande parte das regiões tropicais e subtropicais da América Latina


Figura 1. Desmodus rotundus, conhecido como morcego-vampiro comum, em posição de locomoção terrestre. Fonte: https://www.ufrgs.br/faunadigitalrs/mamiferos/ordem-chiroptera/familia-phyllostomidae/morcego-vampiro-desmodus-rotundus/
Figura 1. Desmodus rotundus, conhecido como morcego-vampiro comum, em posição de locomoção terrestre. Fonte: https://www.ufrgs.br/faunadigitalrs/mamiferos/ordem-chiroptera/familia-phyllostomidae/morcego-vampiro-desmodus-rotundus/

Como as bactérias do gênero Brucella compreendem diversas cepas e espécies que são adaptadas a diferentes hospedeiros, como por exemplo: B. abortus (bovinos), B. suis (suínos), B. melitensis (pequenos ruminantes e humanos) e B. canis (cães), especulava-se que os quirópteros hematófagos pudessem portar uma cepa patogênica de Brucella, já que este é um patógeno transmitido pelo sangue e que circula dentro das células (Moreno, 2006). Em 2023, pesquisadores do Centro de Investigação de Enfermidades Tropicais (CIET) e do Serviço Nacional de Saúde Animal da Costa Rica (SENASA) coletaram setenta e um morcegos-vampiros em cavernas e grutas na região do Parque Nacional Piedras Blancas na Costa Rica, e destes animais foram realizadas coletas e testes laboratoriais para avaliar a prevalência de patógenos. A partir dos resultados, os pesquisadores descreveram uma nova espécie de Brucella, que foi nomeada Brucella nosferati, cujo nome faz referência à obra alemã “Nosferatu, Eine Symphonie des Grauens” ou em português “Nosferatu, Uma Sinfonia de Horror” (Montealegre, 2024). 


No estudo realizado por Hernández-Mora et al. (2023), os organismos de B. nosferati foram encontrados em 24% dos morcegos capturados. Os quirópteros infectados apresentaram lesões placentárias, orquiepididimite, morte fetal, placentite necrossupurativa, fetos mumificados além de infecção em outros órgãos (Hernández-Mora et al. 2023). Assim como em ruminantes domésticos, a bactéria foi isolada de tecidos como placenta, glândulas mamárias, feto e leite. Uma descoberta interessante foi o isolamento do patógeno nas glândulas salivares, o que sugere que a transmissão para outros mamíferos por meio dos hábitos alimentares dos morcegos pode ser plausível, embora ainda faltem estudos que comprovem essa forma de contágio (Hernández-Mora et al. 2023). Além disso, através de caracterização bacteriológica foi evidenciada uma cepa patogênica de B. nosferati isolada em um caso de orquiepididimite canina na Costa Rica, em um cão que vivia em uma área habitada por morcegos D. rotundus, o que sugere que a espécie de bactéria pode ser capaz de causar sintomatologia em outras espécies além do morcego-vampiro (Hernández-Mora et al. 2023).


Fig 2. Placenta de D. rotundus infectada com B. nosferati. Útero com congestão serosa e leve hemorragia focal, exsudato endometrial necrossupurativo, placentite e feto morto de D. rotundus infectado com B. nosferati. Fonte:  https://doi.org/10.1128/msphere.00061-23
Fig 2. Placenta de D. rotundus infectada com B. nosferati. Útero com congestão serosa e leve hemorragia focal, exsudato endometrial necrossupurativo, placentite e feto morto de D. rotundus infectado com B. nosferati. Fonte:  https://doi.org/10.1128/msphere.00061-23

A identificação dessa nova espécie de bactéria e a alta taxa de infecção entre morcegos-vampiros em uma região tropical, aliada aos hábitos alimentares do D. rotundus, evidenciam uma perspectiva relevante para a prevenção de doenças emergentes (Hernández-Mora et al. 2023). Esse cenário merece atenção, pois a B. nosferati apresenta o mesmo potencial virulento das espécies do gênero Brucella mais patogênicas, que inclui também aquelas com potencial zoonótico (Hernández-Mora et al. 2023). Diante disso, espera-se que essa descoberta sirva de base para futuras ações sanitárias e de vigilância epidemiológica em programas de controle da brucelose em áreas de países tropicais onde os morcegos-vampiros estão presentes.


Autor/a: Gustavo Gomes da Luz - Diretor de Linguagens e Acessibilidade do GEAS Brasil

Revisão: Iago Junqueira - Parceiro do GEAS BRASIL pela The Wild Place


Painel Selvagem de Fevereiro/2025


Referências:


  • HERNÁNDEZ-MORA. Virulent Brucella nosferati infecting Desmodus rotundus has emerging potential due to the broad foraging range of its bat host for humans and wild and domestic animals. mSphere, v. 8, n. 4, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.1128/msphere.00061-23.

  • GREENHALL, A. M.; JOERMANN, G.; SCHMIDT, U.. Desmodus rotundus. Mammalian species, v. 202, p. 1-6, 1983.

  • ALVES, R. S. et al. Detection of coronavirus in vampire bats (Desmodus rotundus) in southern Brazil. Transboundary and Emerging Diseases, v. 69, n. 4, p. 2384-2389, 2022.

  • HERNÁNDEZ-MORA, G. et al. Epidemiology of bovine brucellosis in Costa Rica: Lessons learned from failures in the control of the disease. Plos One, v. 12, n. 8, p. 1–17, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0182380

  • MARTÍN-MARTÍN, A. I. et al. Analysis of the occurrence and distribution of the Omp25/Omp31 family of surface proteins in the six classical Brucella species. Veterinary Microbiology, v. 137, n. 1–2, p. 74–82, 2009. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.vetmic.2008.12.003. MONTEALEGRE, D. H. Caracterización fenotípica de aislamientos de Brucella sp. obtenidos a partir de murciélagos (Desmodus rotundus) en Piedras Blancas, Puntarenas, Costa Rica. 2024. Dissertação (Mestrado) – Universidad Nacional, Facultad Ciencias de la Salud, Escuela de Medicina Veterinaria, Costa Rica, 2024.

  • MORENO, E.; MORIYÓN, I. The genus Brucella. In: The prokaryotes. v. 5, n. Part 1, p. 315-456, 2006.




 
 
 

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