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A ameaça da pesca sobre as raias do litoral brasileiro


No início de 2025, pudemos acompanhar diversas notícias relatando o avistamento de grandes cardumes de raias ao longo do litoral sudeste-sul brasileiro. No dia 1º de fevereiro, o fotógrafo Iuri Sena registrou um grupo em Bombinhas, praia localizada em Santa Catarina, além disso no dia 4 de março outro flagrante foi feito em meio ao carnaval, momento no qual esses animais fizeram um verdadeiro desfile na praia do Leme, no Rio de Janeiro. 


Legenda. Esquerda: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) avistado em Santa Catarina . Direita: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) avistado no Rio de Janeiro. Fonte: Esquerda: Fotógrafo Iuri Sena, via Instagram. Direita: Reprodução via YouTube Canal Infornational.
Legenda. Esquerda: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) avistado em Santa Catarina . Direita: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) avistado no Rio de Janeiro. Fonte: Esquerda: Fotógrafo Iuri Sena, via Instagram. Direita: Reprodução via YouTube Canal Infornational.

Em meio a esses relatos que encantam os amantes da natureza, no dia 25 de fevereiro tivemos a notícia de um cardume com mais de 100 animais encontrado morto no litoral de São Paulo com suspeita de interação com rede de pesca de arrasto. Em todos os casos mencionados, apesar de até o momento não haver informações de que os grupos avistados tenham relação entre si, biólogos e profissionais da área afirmaram que os cardumes se tratavam de animais comumente conhecidos como raias ticonha, espécies Rhinoptera bonasus e R. brasilienses. Ambas espécies são conhecidas popularmente pelo mesmo nome devido à  dificuldade de diferenciá-las, já que, de acordo com o biólogo Ricardo Gomes, do Instituto Mar Urbano, a diferenciação só é possível através da análise da dentição dos animais. Ainda assim, ambas espécies se encontram sob risco de extinção segundo a IUCN, sendo a R. bonasus classificada como próxima á extinção (NT) e a R. brasilienses como criticamente em perigo (CR).

Diferente do que muitos pensam, as raias, assim como os tubarões, pertencem à classe dos Chondrichthyes, grupo caracterizado pela composição cartilaginosa ao invés de óssea do esqueleto. Outra característica desses animais é o corpo achatado dorso-ventralmente e as nadadeiras peitorais grandes e achatadas que se fusionam com a cabeça. Em relação à biologia, esses animais são considerados demersais, ou seja,  vivem associadas ao fundo do mar, onde se camuflam e se alimentam de moluscos, caranguejos, pequenos peixes e outros pequenos animais (CASTRO; HUBER, 2012).


Legenda. Esquerda: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) encontrado morto no litoral de São Paulo. Fonte: UNESP São Vicente via Instagram.
Legenda. Esquerda: Cardume de Ticonha (Rhinoptera bonasus e R. brasilienses) encontrado morto no litoral de São Paulo. Fonte: UNESP São Vicente via Instagram.

Outro ponto a ser destacado é que as raias são consideradas espécies k-estrategistas (DE OLIVEIRA, 2019), seguindo uma estratégia reprodutiva caracterizada por um crescimento lento, mas expressivo, e uma baixa taxa de reprodução. Assim, devido ao reduzido número de filhotes, as populações podem demorar décadas para se recuperar dos impactos resultantes das atividades humanas, dentre elas a pesca.


De acordo com o Sumário Executivo do Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Tubarões e Raias Marinhos Ameaçados de Extinção do ICMbio, a pesca excessiva é considerada a principal ameaça para os elasmobrânquios marinhos em águas brasileiras. Nesse contexto, a pesca de arrasto, apesar de proibida pelo Projeto de Lei 347/22 da Comissão do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, ainda ocorre ilegalmente. Nela a rede de pesca é tracionada e arrastada sobre o leito marinho capturando os organismos encontrados diretamente sobre ou próximos ao fundo e por se tratar de uma forma de captura não seletiva, gera um grande rastro de destruição pelo chamado bycatch, ou captura acidental, na qual as espécies que são involuntariamente pescadas, são mortas e descartadas (CASTRO; HUBER, 2012). E foi assim, que acredita-se que o cardume encontrado no litoral de São Paulo no início do ano foi morto. 


Além do bycacth, a pesca fantasma causada por redes abandonadas e outras ameaças como degradação de habitat dos ecossistemas marinho-costeiros, exploração de petróleo e gás, e o próprio tráfego marítimo afetam as raias e diversas outras espécies. Segundo dados de uma pequisa realizada em 2019, de acordo com dados da IUCN, das espécies já avaliadas no Brasil 35% se encontram em estado preocupante, e de acordo com o ICMBio esse percentual sobe para 38,3%. (DE OLIVEIRA, 2019). Assim, medidas de regulamentação e fiscalização da pesca e outras atividades marítimas se mostram essenciais para conservação do ambiente aquático, das populações de raias e para que notícias como a relatada em São Paulo não se repitam. 



Autora: Luiza Torquato - Diretora dos Representantes Regionais  do GEAS Brasil

Revisão: Iago Junqueira - Parceiro do GEAS BRASIL pela The Wild Place

Painel Selvagem de Março/2025


REFERÊNCIAS

DE OLIVEIRA, C. D. L. et. al. Diversidade de raias marinhas na costa do Brasil e seus estados de ameaça nacional e global. Arquivos de Ciências do Mar, Fortaleza, v. 52, n.1, p. 7-20, 2019.

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE (ICMBio). Sumário Executivo do Plano de Ação Nacional para a conservação dos Tubarões e Raias Marinhos Ameaçados de Extinção

CASTRO, Peter; HUBER, Michael E. Biologia Marinha. 8. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012.

O ECO. Cardume de raias faz desfile surpresa em pleno Carnaval carioca. 25 fev. 2025. Disponível em:https://oeco.org.br/salada-verde/cardume-de-raias-faz-desfile-surpresa-em-pleno-carnaval-carioca/Acesso em: 3 mar. 2025.

CNN BRASIL. Vídeo: cardume de raias é flagrado em praia de Santa Catarina. CNN Brasil, 24 fev. 2025. Disponível em:  https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/sul/sc/video-cardume-de-raias-e-flagrado-em-praia-de-santa-catarina/. Acesso em: 3 mar. 2025.

G1. Mais de 100 raias ameaçadas de extinção aparecem mortas em praia do litoral de SP. G1 Santos e Região, 25 fev. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2025/02/25/mais-de-100-raias-ameacadas-de-extincao-aparecem-mortas-em-praia-do-litoral-de-sp-video.ghtml. Acesso em: 8 mar. 2025.


 
 
 

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