O alerta das profundezas oceânicas: conheça a história do Eurythenes plasticus
- GEAS Brasil
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O Eurythenes plasticus é uma espécie de anfípode descoberta em 2015, durante um estudo que chamou atenção para o crescente impacto dos resíduos plásticos nos ecossistemas marinhos. Seu nome científico faz uma alusão ao “plástico”, e isso se deve ao fato de que, no momento de sua descoberta verificou-se que já estava contaminado com microplásticos em seu organismo, constatando a onipresença desse material (Weston et al., 2020).
Os anfípodes são pequenos crustáceos que podem ser observados a olho nu, seus tamanhos variam de 1 a 20 centímetros (Oliveira, 1953). O E. plasticus é fisicamente muito parecido com um camarão, com corpo esguio, carapaça robusta e antenas longas, características típicas de espécies que vivem em zonas abissais. Ele teve seu tamanho descrito de 15 à 48 mm, sendo a média de 15 mm para indivíduos juvenis e 48 mm para uma fêmea adulta, tendo uma alimentação muito diversa, conseguindo comer tudo que estiver disponível em seu ambiente, inclusive plástico (Weston et al., 2020)
Legenda: Fotografia de espécies de E. plasticus: representação de uma fêmea de 6865m (em cima), parátipo juvenil de 6865 m (em baixo à esquerda), parátipo masculino de 6010 m (embaixo à direita). Fonte: Weston, 2020.
Em um trabalho de 2021, um grupo de pesquisadores constatou a presença de partículas de tereftalato de polietileno (comumente chamado de PET), um material muito comum na produção de garrafas, no intestino de indivíduos dessa espécie (Weston et al., 2020). O plástico ingerido por esses animais provavelmente tem origem de resíduos que foram levados pelas correntes marítimas ou originados de atividades antropogênicas, como a pesca e o descarte inadequado do lixo (Elias, 2015). Com o tempo, os plásticos fragmentam-se em partículas menores, chamadas de microplásticos (Olivatto, 2018), podendo ser consumidos por uma vasta gama de indivíduos, e conforme pode ser constatado no estudo de Weston e colaboradores, até os organismos que habitam as profundezas podem ser contaminados.
Legenda: Microfibra de tereftalato de polietileno (PET) encontrada no intestino de um indivíduo de E. Plasticus. nas fossas Marianas. Fonte: Weston, 2020.
A ingestão de microplástico por organismos como o E. plasticus pode ter sérias consequências para a saúde desses animais e, consequentemente, para todo o ecossistema marinho (Weston, 2020). As partículas ingeridas podem causar uma obstrução gastrointestinal, reduzindo a capacidade de digestão, comprometendo o estado nutricional desses indivíduos e interferindo na sua flutuabilidade e comportamento de natação (Silva, 2021).
Os microplásticos (MP) são fragmentos de plásticos com tamanhos inferiores a 5 mm, ainda possuem características como alta resistência a degradação, fixação de contaminantes químicos e biológicos em sua superfícies e uma alta dispersão em todo o ambiente, devido a principalmente seu tamanho e sua capacidade de degradação (Batista, 2023). Os plásticos além de liberarem MP, também podem soltar compostos tóxicos, como ftalatos e bisfenol A (BPA), ambos nocivos à saúde de organismos marinhos, podendo se acumular ao longo da teia alimentar devido a sua bioacumulação, chegando nos seres humanos, com grande potencial carcinogênico (Edaes e Souza, 2020).
A presença de plásticos nas profundezas oceânicas, como foi evidenciado pela descoberta com o E. plasticus, sublinha a necessidade urgente de ações para combater a poluição (Weston, 2020). Diversas organizações internacionais vêm alertando sobre os impactos ambientais oriundos da contaminação por plásticos e incentivando políticas públicas e práticas sustentáveis que busquem reduzir o uso deste material, promovendo a reciclagem, aumentando a conscientização do uso e incentivando a alternativa com plásticos biodegradáveis, como as ações promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) (Coutinho et al., 2004).
O E. plasticus representa não apenas uma descoberta científica interessante, mas também um alerta sobre a crescente ameaça da poluição por plásticos, que atingiu regiões abissais (Weston, 2020). Sua existência reforçou a necessidade de novas medidas e tecnologias inovadoras para substituição do uso e remoção dos plásticos nessas áreas, assim como ao incentivo a projetos que combatem a causa, como por exemplo o projeto TAMAR, o qual desempenha um papel muito importante ao conscientizar a população sobre os impactos da poluição dos oceanos e engajar comunidades locais em ações de preservação (Suassuna, 2004). Organizações como The Ocean Cleanup, também têm se destacado ao desenvolver sistemas para retirar plásticos dos mares, enquanto projetos como Sea Shepherd atuam diretamente na remoção de resíduos marinhos e na proteção da biodiversidade (Morrison, 2019; Diógenes, 2024). O aumento da educação e conscientização, por meio de campanhas e programas como essas organizações propagam, é essencial para que a população compreenda a gravidade da problemática e se envolva em soluções efetivas para mitigar a poluição plástica.
Legenda: Fotografia aérea de um interceptor de lixo localizado em Sandy Gully, Austrália. Fonte: The ocean Cleanup, 2020.
Autor/a: Victor Silva Lucino - Presidente do GEAS Brasil
Revisão: Iago Junqueira - Parceiro do GEAS BRASIL pela The Wild Place
Painel Selvagem de Abril/2025
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